• © Pedro Medeiros, Monumento a Luís Vaz de Camões, 2021

Monumento a Luís Vaz de Camões

Artigo por
Diogo Ramada Curto

Resumo – Praça Luís de Camões

O monumento a Luís de Camões, na Praça até então chamada do Loreto, foi inaugurado a 9 de Outubro de 1867, com pompa e circunstância. O seu autor, Victor Bastos, colocou a estátua em bronze sobre um pedestal, ladeado por oito estátuas em pedra de lioz. Escolhidas por uma sub-comissão para o efeito nomeada, representavam: os cronistas Fernão Lopes e Gomes Eanes de Azurara, o cosmógrafo Pedro Nunes, os historiadores quinhentistas João de Barros e Fernão Lopes de Castanheda, e os poetas épicos Vasco Mouzinho de Quevedo, Jerónimo Corte-Real e Francisco de Sá de Meneses. A história, a ciência e o canto épico dos feitos gloriosos dos portugueses serviram como elementos de uma memória imperial, que os novos projectos de exploração, militar e científica, já em curso em África, procuravam actualizar.

Palco das críticas queirosianas, a centralidade do largo na vida da cidade conferia um contraste profundo entre a decadência de um Portugal monárquico que estimulava um tipo de nacionalismo oficial, imaginado à custa das glórias imperiais do passado, e as ideias republicanas que soavam dentro e fora do país. Mas também o republicanismo se apoderou do simbolismo camoniano. A comemoração republicana do Poeta, no Tricentenário da sua morte, desvinculou-se da glorificação dos feitos do passado. Ao nacionalismo oficial, monárquico, associado à inauguração do monumento, sucedeu um novo nacionalismo, republicano e emancipado, baseado na consciência do povo (e imperial).

A associação de Camões às glórias dos feitos imperiais foi retomada pelo Estado Novo, que se apropriou de Camões para celebrar o Dia da Raça. Para isso, centrou-se no mais majestoso Terreiro do Paço, onde as tropas desfilavam e se distribuíam as condecorações pelos heróis da guerra colonial. Nalguns casos, pelas suas viúvas e órfãos. Aliás, o Portugal dos veteranos dessa guerra de treze anos continua a existir e só os que sofrem de uma espécie de amnésia intencional fingem que o que está em causa é, apenas, um grupo de traumatizados em extinção. Entretanto, a Praça Luís de Camões foi-se esvaziando de sentido político, talvez por ter permanecido associada mais à República e aos meios da resistência à Ditadura. 

Após o 25 de Abril, Camões e Os Lusíadas acabaram por ser esquecidos, não passando de uma alínea, apesar de tudo obrigatória, do ensino secundário. Paralelemente, manifestações de fascistas nacionalistas, que pretensamente reclamam para si a figura de Camões, enquanto arauto de uma suposta raça imperial, foram as primeiras a voltar à Praça, desde a década de 1980. Seguiram-se-lhes uma série de contra-manifestações, organizadas à esquerda, numa tentativa de também tornar seu o mesmo local. Será, por isso, o Camões a nossa Bastilha? 

Galeria

  • © Pedro Medeiros, Monumento a Luís Vaz de Camões, 2021

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