Banco Nacional Ultramarino
Artigo por
Jorge M. Pedreira (IHC/UNL)
Banco Nacional Ultramarino
Quem caminhe hoje na Baixa de Lisboa em direção ao Tejo, deparará, já próximo do Terreiro do Paço, com uma vasta construção vestida de tela branca cobrindo os andaimes que em toda a volta a cingem. Quem demore um pouco mais o olhar, descobrirá entre os andaimes, junto às esquinas, a revelação da sua identidade persistente, sob a forma de medalhões de bronze ostentando uma insígnia, um veleiro navegando sobre as ondas e, por baixo, a inscrição: Banco Nacional Ultramarino (BNU).
Funcionou ali, por muito tempo, a sede do Banco, que foi durante mais de cem anos o instrumento e a imagem do financiamento do fomento ultramarino. Constituiu-se em 1864, pela iniciativa de homens ligados aos negócios e à política, que acreditavam que a associação de capitais, com a proteção do Estado, poderia ser a alavanca do desenvolvimento dos domínios ultramarinos. Embora privado, recebia do Estado importantes prerrogativas no ato da sua fundação: privilégio exclusivo de constituição de instituições bancárias e de emissão de notas nos territórios ultramarinos, por exemplo.
A expansão da sua atividade prosseguiu com a abertura de agências nos territórios do ultramar, com o investimento na navegação e em infraestruturas e a concessão de empréstimos ao Estado e a particulares, nomeadamente a fazendeiros. Patrocinou a expansão territorial ultramarina, sustentando as iniciativas da Sociedade de Geografia de Lisboa e oferecendo apoio financeiro às grandes explorações agrícolas, por exemplo em São Tomé. O triângulo institucional da Sociedade de Geografia, da Associação Comercial de Lisboa e do BNU era então decisivo para a promoção dos interesses em África.
Nas primeiras décadas do século XX, o Banco cresceu, à medida que cresciam os investimentos, mas também as dívidas, das colónias. Este rumo de prosperidade seria interrompido abruptamente. A internacionalização do Banco, com sucursais europeias e no Brasil, tornara-o vulnerável à crise internacional, ao mesmo tempo que a Grande Depressão afectava as colónias.
Em 1964, depois de uma forte recuperação, a cerimónia de celebração do seu centenário decorreu no salão nobre da Sociedade de Geografia, perante as mais altas autoridades do Estado. Sabemos hoje, com o recuo do tempo, que tamanha demonstração de poder e de grandeza se fazia no momento em que esse mundo, que o BNU ajudara a construir – o moderno colonialismo português –, entrava no caminho inexorável do desmoronamento. O BNU sobreviveu, porém, tanto à Revolução do 25 de Abril, como à descolonização, continuando a funcionar por quase trinta anos.
Ao evocar a situação da antiga sede do BNU e a forma como dela se tratou depois da mudança para as Avenidas Novas, é quase irresistível tomar essa narrativa como metonímia do modo como se tece a memória coletiva do império, do passado colonial, de que o Banco e a sua sede formam um lugar insubstituível. A antiga grandiosidade está arruinada. Destruiu-se o edifício, mas não até ao fim. Agora queremos dar-lhe um uso moderno, mas não sabemos bem como. É um incómodo peso do passado, que comprime o futuro.
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