• © Pedro Medeiros, Rua do Poço dos Negros, ECHOES, 2021

Rua do Poço dos Negros

Artigo por
Giuseppina Raggi

Rua do Poço dos Negros

A rua do Poço dos Negros interliga a calçada do Combro com o bairro da Madragoa. As explicações históricas sobre o topónimo foram investigadas, principalmente, por Isabel Castro Henriques, especialista em História da África, e pelo olisipógrafo José Sarmento de Matos, que chegaram a duas divergentes conclusões. De um lado, o nome é justificado pela ordem dada por D. Manuel I, em 1515, de escavar um poço onde colocar os corpos dos escravizados falecidos, recém-chegados a Portugal, visando travar a prática de os atirarem pelas encostas de Santa Catarina e evitar, desta forma, miasmas e pestilências. Do outro lado, o topónimo é explicado pela presença de um poço de água pertencente aos Beneditinos, chamados ‘padres Negros’ por causa do traje, ao qual o povo de Lisboa tinha livre acesso. Nas interpretações dos dois autores emerge a evidência do tema sensível, que toca cordas ligadas à maneira de reconhecer e elaborar o passado colonial português, em particular, no que diz respeito ao tráfego negreiro atlântico.
Na última década, a toponímia das cidades europeias tem vindo a ser questionada. Em Lisboa, o debate começou a surgir em anos recentes. A crítica sobre a escassa visibilidade das mulheres, a preponderância de referências católicas, o destaque dado aos ‘descobridores’ portugueses, à ‘epopeia marítima’ (sem qualquer denuncia das implicações do tráfego negreiro transatlântico que inaugurou), à exaltação do império português (sem qualquer referência ao colonialismo e à violência exercida) caracteriza atualmente o debate público. Neste processo de renomeação ou de contextualização dos nomes de ruas e praças da cidade foi aprovado um projeto da associação Batoto Yetu que visa colocar no espaço público, em 2021, placas que assinalam a história de lugares conexos com a vivência das pessoas negras. Uma dessas placas é destinada à rua do Poço dos Negros.

Galeria

  • © Pedro Medeiros, Rua do Poço dos Negros, ECHOES, 2021

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